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É Possível Enfrentar a Corrupção de Forma Legal? Entenda Neste Artigo Como É Possível Vencer a Corrupção Sem Desrespeitar as Leis do Brasil.

A corrupção é um mal que merece ser enfrentado, mas de forma adequada e  nos limites da Lei. Por mais que tal delito seja nocivo ao bem público, à organização do Estado e ao desenvolvimento sadio das relações público-privadas, nada justifica o arbítrio do Estado, e este mal sempre é o maior a ser evitado.

Ao contrário do que muitos sustentam, é possível combater a corrupção pelas vias legais. Talvez não com a mesma repercussão midiática, mas certamente com melhores resultados. A luz das câmeras pode ofuscar a racionalidade que deve pautar investigações e julgamentos, bem como afetar a serenidade e a imparcialidade esperadas daqueles aos quais são atribuídas as tarefas de acusar e julgar, de lidar com a liberdade de terceiros.

Por algum tempo, qualquer defesa da legalidade nesse campo foi mal vista. Fixou-se uma ideia de que toda crítica aos excessos de operações como a Lava Jato, às conduções coercitivas, às prisões pouco fundamentadas, ao vazamento de dados sigilosos, à parcialidade de magistrados, às condenações sem provas, implicaria a defesa de criminosos e suas práticas.

No plano legislativo, é possível ir além da ciranda do aumento de penas e do rigor das punições propostas recentemente pelo Governo Federal — já reconhecidas como inúteis em diversos trabalhos acadêmicos no Brasil e no exterior. Mais importante é, por exemplo, organizar as regras de competência judicial, para evitar longas discussões sobre que juiz é competente para apurar cada delito, em especial em casos de crimes complexos, transnacionais e cibernéticos.

Ainda é preciso atualizar as regras de prescrição, definir parâmetros para a quebra de dados nas investigações criminais, atualizar a legislação sobre drogas, racionalizar o procedimento de leniência de empresas que pretendem colaborar com o esclarecimento de crimes e definir com mais clareza o crime de obstrução de Justiça.

 Uma discussão frequente na prática jurídica refere-se à possibilidade ou não  de concurso de crimes entre a corrupção ativa e a lavagem de dinheiro, nas hipóteses em que se imputa o pagamento de vantagem indevida ao funcionário público que ocorre com ocultação ou fraude.

Não é nenhuma novidade que, em muitos casos de corrupção, o pagamento de propina a funcionários públicos não ocorre diretamente ao funcionário, e sim com a utilização de sofisticados esquemas que envolvem a participação de terceiros “laranjas” e/ou a utilização de negócios fraudulentos para que a quantia possa chegar ao destinatário final sem levantar muitas suspeitas das autoridades de persecução criminal.

Em casos tais, é comum verificar a dupla imputação de lavagem de dinheiro e corrupção ativa  – aos particulares envolvidos na transação. A aplicação cumulada dos tipos penais não nos parece acertada.

Em primeiro lugar, porque os valores pagos a título de vantagem indevida representam, para o corruptor ativo, um decréscimo patrimonial, não sendo possível falar-se em produto de crime. Na perspectiva do corruptor ativo, o valor direcionado para o pagamento da vantagem indevida é um mero instrumento do crime, pois não configura benefício auferido com a prática delitiva. E, como instrumento do crime – e não produto – não pode ser objeto material da lavagem de dinheiro.

A rigor, o valor correspondente à vantagem indevida é destinado ao corruptor passivo, sendo produto do crime apenas para este. É importante mencionar que a natureza ilícita somente se verifica quando o destinatário da vantagem indevida tem disponibilidade sobre esta. Neste sentido são os ensinamentos de Nuno Brandão, quando afirma que:

“(…) a corrupção ativa é, por definição, insuscetível de gerar vantagens aptas a serem lavadas. Nesta modalidade de corrupção o corruptor abre mão do bem que forma o suborno, pelo que, como é óbvio, deixa essa vantagem de poder ser lavada em seu benefício. Claro que do ato funcional que figura como contrapartida da vantagem poderão resultar benefícios patrimoniais para o corruptor, esses, sim, suscetíveis de serem lavados em seu benefício. Mas o branqueamento da vantagem propriamente dita, a que integra a factualidade típica dos crimes de corrupção, parece-nos só ser cogitável no plano da corrupção passiva (…)”.

No crime de corrupção ativa em transação ativa em transação internacional (CP, art.337-B) ainda há mais uma questão: o tipo penal prevê a modalidade de dar a vantagem indevida, direta ou indiretamente, verbo que não existe no tipo penal de corrupção ativa simples, limitado aos atos de prometer ou oferecer a propina (CP, art.333).

Nesse caso, a transferência de recursos por interpostas pessoas ou estruturas integra o tipo penal do art.337-B, uma vez que o termo indiretamente abriga todas essas modalidades de repasse. A entrega dos valores indevidos, ainda que de forma indireta, é uma das etapas do crime de corrupção e não pode ser apenada como lavagem de dinheiro.

Esse foi o entendimento recente da 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região no julgamento da Apelação 0022500-03.2014.4.02.5101/RJ. No caso concreto, funcionários de uma empresa brasileira foram acusados de oferecer, prometer e efetivamente pagar vantagem indevida a um funcionário público no exterior. De acordo com a acusação, o pagamento ocorreu por intermédio de contratos fraudulentos de representação comercial firmados com terceiros, que seriam responsáveis por repassar os valores ao funcionário público estrangeiro. Por estes fatos, os envolvidos foram denunciados e condenados pelos crimes de corrupção ativa em transações internacionais (art. 337-B, CP) e lavagem de dinheiro (art. 1º, L. 9.613/98).

O TRF2, no julgamento da apelação, entendeu que não seria possível configurar-se o delito de lavagem de capitais. Nos termos do voto do Relator:

“A meu ver, a celebração do referido contrato integrou a própria materialidade da corrupção ativa internacional, até porque a consumação desse crime, na modalidade dar indiretamente, envolve, necessariamente, a entrega de forma dissimulada do valor que fora acordado entre os envolvidos. É valioso ressaltar que, embora o crime de corrupção ativa em transação comercial internacional seja um tipo penal misto alternativo, com três verbos nucleares, consistentes nos atos de ‘prometer’, ‘oferecer’ e ‘dar’, é certo que os dois primeiros, além de serem absorvidos pelo último quando este ocorrer, nem mesmo gerariam produto passível de ocultação ou dissimulação, não podendo, pois, caracterizar-se como crimes antecedentes ao delito de lavagem de dinheiro, razão pela qual a discussão em torno do tema da consunção, na espécie, deve se limitar ao tipo penal relativo ao verbo ‘dar’. Assim, diante da natureza do crime de corrupção ativa internacional e das circunstâncias que norteiam os fatos, concluo que a dissimulação dos valores foi imprescindível para a consumação do delito de corrupção ativa internacional, na modalidade ‘dar indiretamente’, não podendo, por esse motivo, ser considerada como uma ação autônoma. Dessa forma, considerando-se que, no caso concreto, os atos de ocultação/dissimulação típicos da lavagem de dinheiro limitaram-se ao pagamento indireto, embora sob uma forma complexa, de valores frutos da corrupção ativa, havendo continência, portanto, entre os tipos penais, deve ser reconhecido o post factum impunível com relação ao crime de branqueamento de capitais, aplicando-se, em consequência, o princípio da consunção”.

Nota-se que o Tribunal reconheceu a consunção entre a corrupção e a lavagem de dinheiro, uma vez que o pagamento por interpostas pessoas e estruturas caracteriza a forma indireta de repasse prevista no tipo penal da corrupção internacional.

Mais uma vez, resta claro que nas hipóteses em que a ocultação já se encontra prevista e expressa no desenho típico do crime antecedente, não pode ser usada novamente para materializar a lavagem de dinheiro, sob pena de ver-se caracterizado o bis in idem, vedado na seara penal.

Além disso, é bom ressaltar que o Código Penal, em seu artigo 317, define o crime de corrupção passiva como o de “solicitar ou receber, para si ou para outros, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem.”

Se a corrupção ativa tem a ver com o ato de oferecer a compensação ilícita, então a modalidade passiva está relacionada com o ato de receber essa compensação. Esse tipo de corrupção é cometido pelo agente público corrompido.

Mas note que, apesar de ser chamado de “passivo”, isso não significa que o corrompido não tenha algum papel ativo, por assim dizer, na prática da corrupção. Afinal, muitas vezes ele solicita a compensação para que ele deixe de fazer seu trabalho ou faça algo que não é condizente com as suas funções.

Da mesma forma como acontece com a corrupção ativa, o crime de corrupção passiva já é configurado pelo simples ato de solicitar ou receber vantagem indevida, sem que seja necessário que a pessoa solicitada atenda ao pedido.

Eles são caracterizados por dano ao erário, enriquecimento ilícito e violação aos princípios administrativos. 

A Lei de Improbidade Administrativa define enriquecimento ilícito o ato de “auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades públicas”. As ações de improbidade se referem, por exemplo, a um funcionário que recebeu dinheiro ou qualquer vantagem econômica para facilitar a aquisição, permuta ou locação de um bem móvel ou imóvel, a contratação de serviços pela administração pública, ou ainda, a utilização de veículos da administração pública para uso particular. Outro tipo de enriquecimento ilícito seria receber dinheiro para tolerar a prática de jogos de azar, prostituição ou narcotráfico.

Entre os atos que causam prejuízo ao erário, enquadrados, portanto, na Lei de Improbidade Administrativa, estão: permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado e ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento.

Também está incluída no conceito de improbidade administrativa a violação de princípios da administração pública, condutas que violem o dever de honestidade, como, por exemplo, fraudar um concurso público, negar a publicidade de atos oficiais ou deixar de prestar contas quando se tem a obrigação de fazê-lo.

Lei nº 14.230/21, que reforma a Lei de Improbidade Administrativa foi sancionada pelo presidente sem vetos, em outubro de 2021. Foi a maior mudança na norma, em vigor desde 1992.

A principal alteração do texto é a exigência de dolo (intenção) para que os agentes públicos sejam responsabilizados. Danos causados por imprudência, imperícia ou negligência não podem mais ser configurados como improbidade.

A ação deverá comprovar a vontade livre e consciente do agente público de alcançar o resultado ilícito, não bastando a voluntariedade ou o mero exercício da função. Também não poderá ser punida a ação ou omissão decorrente de divergência na interpretação da lei.

Aliás, a nova lei torna a contratação de parentes um tipo de improbidade, mas estabelece que não se configurará improbidade a mera nomeação ou indicação política por parte dos detentores de mandatos eletivos, sendo necessária a aferição de dolo com finalidade ilícita por parte do agente; prevê escalonamento de punições: em casos de menor ofensa à administração pública, a pena poderá ser limitada à aplicação de multa, sem prejuízo do ressarcimento do dano; autoriza o parcelamento, em até 48 meses do débito resultante de condenação pela prática de improbidade administrativa se o réu demonstrar incapacidade financeira de saldá-lo de imediato; 

Limita o bloqueio direto das contas bancárias dos acusados, com preferência ao bloqueio de bens de menor liquidez, como imóveis e automóveis; estabelece que a ação de improbidade administrativa será impedida em casos de absolvição criminal do acusado, confirmada por órgão colegiado, em ação que discuta os mesmos fatos; permite que as penas aplicadas por outras esferas sejam compensadas com as sanções aplicadas nas ações de improbidade administrativa. Pela legislação atual, são esferas independentes.

Portanto, o regramento administrativo vem sendo mudado com as demandas a fim de promover um efetivo combate e defesa a corrupção e atos ímprobos, sendo desnecessário o evidente julgamento midiático do fato.

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